Amar, Será Que É Para Mim?

Amar. Uma palavra tão curta, mas tão cheia de perguntas. Será que é para mim? Será que este corpo, marcado por histórias e estigmas, consegue ser amado? Essas eram as questões que ecoavam na minha mente cada vez que eu ousava pensar em me apaixonar.

As vozes eram persistentes, como um coro invisível que me acompanhava: — Você é sujo. — Com seu passado, ninguém vai te querer, ainda mais sabendo que você tem HIV. — Só alguém que se odeia muito ficaria com uma pessoa doente.

Algumas dessas frases foram ditas na minha cara, outras chegaram de forma indireta, em conversas nas quais ninguém sabia que eu era uma Pessoa Vivendo com HIV (PVHIV). Mas todas elas me feriram. Abriram buracos em mim que levaram anos para cicatrizar. E é por isso que, aqui, deixo um conselho: cuidado com o que você diz. E, mais importante, cuidado com o que você aceita que seja dito perto de você. Porque, mesmo sem saber, você pode estar machucando alguém, alguém que, em silêncio, carrega batalhas que você não conhece.

Não é fácil ser PVHIV. O mundo nos impõe tantos rótulos que, às vezes, nós mesmos começamos a acreditar neles. Incapaz de ser amado, cuidável ou digno de afeto — era assim que eu me sentia. Cada vez que cogitava me relacionar com alguém, o medo vinha. Porque sabia que, em algum momento, eu iria querer contar.

Contar não é uma obrigação, mas, para mim, era inevitável. Só que junto com a vontade de abrir meu coração, vinham os cenários possíveis. Eu os conhecia bem:

  1. A pessoa surtaria, me julgaria e me deixaria.
  2. A pessoa ouviria, mas depois diria que “não sabia se queria namorar agora” — e, logo depois, começaria um relacionamento com outra pessoa. (Sim, já vivi isso, e até dá para rir agora, rs.)
  3. A pessoa surtaria, mas me acolheria, mostrando que meu corpo também podia ser amado.

 

Passei pelos três. Aprendi muito com cada um deles. Mas, com o tempo, percebi que a angústia de contar era maior do que a de conviver com o vírus. Então, decidi me expor.

Essa decisão, é importante dizer, veio do privilégio. Sou um entre poucos que tiveram o suporte necessário para enfrentar os olhares e julgamentos. E, por isso, digo a você, leitor: reflita sobre seus privilégios. Use-os para ser um agente de mudança, para construir um mundo onde ninguém precise esconder quem é.

Eu me cansei de ver a “cara do HIV” como um estigma congelado no tempo. Sempre as mesmas referências: Cazuza, Renato Russo. Queria mais. Queria que as pessoas vissem outras faces, outros corpos, outras histórias. Foi aí que decidi: eu vou ser essa cara. Pelo menos na minha cidade, na minha bolha.

Não me envergonho disso. Muito pelo contrário, me orgulho. Quero que, quando alguém receber o diagnóstico, saiba que não é um ponto final, mas um ponto e vírgula. É o início de muitos recomeços.

Então, volto à pergunta inicial: amar, será que é para mim? A resposta é sim. Amar é para todos. Porque amar começa dentro, no momento em que decidimos nos acolher, mesmo quando o mundo tenta nos dizer o contrário.

Por Matheus Maia Moraes

Comunicólogo, apaixonado por moda, cultura pop e viagens, sou um entusiasta do crossfit e vivo com HIV há quase uma década. Ao longo dessa jornada, compartilho minhas experiências e aprendizados, celebrando a resiliência, o estilo e a autenticidade. Também sou ativista, lutando por mais visibilidade e direitos para pessoas vivendo com HIV, sempre buscando inspirar e empoderar quem me acompanha.

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